quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

COLDPLAY – A HEAD FULL OF DREAMS (2015)

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A Head Full of Dreams é o passo mais fundo do Coldplay para o centro do pop. E o menos original também.
Por Lucas Scaliza
O que faz uma banda egressa do melancólico cenário alternativo inglês quando alcança o topo do mundo pop? Uma banda como o Coldplay, que saiu de casas pequenas com shows intimistas e foi alçada ao patamar de grande grupo de rock/pop e passou a frequentar estádios de futebol, beisebol e arenas igualmente lotadas no Japão, nos Estados Unidos, na Europa e na América do Sul; o que uma banda dessas faz para se manter no topo? Bem, já vimos essa história antes comU2Maroon 5 e tantas outras. Parece que o protocolo parece sempre dizer o seguinte: não seja mais alternativo, não seja mais soturno, celebre a vida e, se possível, siga o fluxo!
A Head Full Of Dreams é o sétimo disco de estúdio do Coldplay e é exatamente o que a banda disse que seria: um disco colorido, para cima, vivaz, divertido e bem comportado. Um disco, diria eu, para quem gosta de “Viva La Vida” (a música, não o álbum inteiro Viva La Vida or Death & All His Friends, de 2008) e quem gostou das cores e da pegada pop de Mylo Xyloto (2011). Não é, de forma alguma, para o fã que um dia se surpreendeu com Parachutes (2000) e A Rush Of Blood To The Head (2002), achando que Chris Martin e companhia poderiam representar no início deste novo século algo parecido, quem sabe, com a inadequação, dores e reflexões que Pixies ou The Smashing Pumpkins representou para gerações anteriores. Ou seja, A Head Full Of Dreams é um passo mais fundo do quarteto inglês para o centro do pop mainstream. Os últimos suspiros roqueiros ficaram lá no Viva La Vida (o disco) e agora se apresentam como uma banda sonhadora, fofa e mauricinha.
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A melhor música do disco, e talvez a única que a longo prazo poderá sobreviver, é o single “Adventures of a Lifetime”. Uma música que fica entre o pop de banda com o pop eletrônico, com um bom riff de Johnny Buckland, baixos bem presentes de Guy Berryman e mais suingue do que qualquer outra faixa que eles já gravaram. Ainda assim, é o tipo de música suingada para as rádios atuais, que aceitam melhor apenas uma quantidade limitada de suíngue, como “The Adventures of Rain Dance Maggie” dos Red Hot Chili Peppers. Apesar do clipe vazio e sem graça que ganhou, é uma faixa que serve bem aos propósitos para que serve. Mas se você torcer o nariz para “Adventures of a Lifetime”, o restante poderá não ser das coisas mais interessantes.
A Head Full Of Dreams escancara a inclinação do grupo para o eletrônico, embora isso não prejudique as qualidades da banda, e teve dois noruegueses muito ativos na produção e da composição também: Mikkel S. Eriksen e Tor Erik Hermansen, o duo Stargate, que já há bastante tempo vem produzindo artistas pop e compondo músicas que mais parecem a aplicação de uma receita de bolo para fazê-los continuar caindo no gosto do público e tocar bastante na rádio e ganhar visualizações no canal da Vevo. Ou seja: todas as 12 faixas que o Coldplay escolheu para este álbum se parecem com algo que você já ouviu antes, fazendo desta a obra menos criativa dos ingleses.
“A Head Full Of Dreams” abre o álbum já indicando que será uma curta viagem de cores, batidas bem regulares, guitarras com delay e “ôooos”. Parece uma música de abertura de festa e nada mais. “Bird” mantém o ritmo acelerado, trazendo aquelas melodias de tom menor que contrastam com a animação da faixa. Não é uma faixa que vá ficar em sua memória, com exceção da linha de baixo. “Everglow”, segundo single do álbum, é a faixa de piano mais sem graça da discografia. Ela é bonita pois foi feita para ser facilmente absorvida, mas absolutamente nada nela chama a atenção. Outra que segue pelo mesmo viés é “Amazing Day”, mais uma balada em 3/4 melosa e pensada para embalar vídeos de mensagens positivas e formaturas. Se quiser um exemplo de balada de piano marcante em todos os sentidos, basta lembrar de “The Scientist”, da mesma banda aliás.
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Certa vez, Chris Martin afirmou que Rihanna era a única cantora que a banda cogitara convidar para cantar em um álbum, o que ela fez em “Princess of China”. Em 2014 Avicii foi responsável por uma música dance da banda. E agora eles se renderam de vez às participações especiais tão bem quistas por parte do público e que servem tão bem ao show business pop, fazendo com que um artista pegue carona no sucesso de outro. “Hymn For The Weekend” tem programação do sueco Avicii novamente e vocais de Beyoncé, mas Chris Martin é a voz onipresente, fazendo com que a participação dela quase não seja notada. Em “Fun” a voz do refrão ganha reforço da sueca Tove Lo, mais uma inclusão que dá pouco espaço para a cantora. A ex-mulher de Martin, a atriz Gwyneth Paltrow, também canta em “Everglow”, mas é algo que passa totalmente desapercebido. Nos três casos poderiam ter chamado qualquer outra voz que daria praticamente no mesmo, já que não reconhecemos nenhuma das três mulheres nas faixas. Diferente do New Order que convidou Iggy Pop para rosnar em seu novo disco, Music Complete, fazendo com que a participação do ícone punk fosse original para ambos os lados.
“Up&Up” é a segunda faixa do disco que quase vale a pena. Para esta canção, ninguém menos que Noel Gallagher foi chamado para fazer um solo. O problema é que seu solo não tem cara deNoel Gallagher, tem cara de Johnny Buckland. Ou seja… mais um nome de peso subaproveitado. A cantora americana de soul e gospel Merry Clayton também dá as caras em “Up&Up”, mas ela apenas engrossa o refrão e faz alguns fills vocais de fundo, pois a voz de Martin ainda é quem manda aqui de cabo a rabo. Impossível não deixar de citar também a voz de Barack Obama no discurso “Amazing Grace” no bonito interlúdio “Kaleidoscope”. Talvez o presidente americano tenha a única participação que valeu a pena no disco.
Fica, então, a sensação de que nomes como Beyoncé, Tove Lo, Merry Clayton, Avicii e Gwyneth Paltrow, assim como o de Obama, são para fins de marketing, já que não há qualquer real encontro musical digno de nota. Mesmo Rihanna tendo cantado em uma das composições mais fracas da banda, pelo menos teve espaço para que sua voz brilhasse por conta própria.
O disco anterior, Ghost Stories (2014), era bastante despretensioso, mas bonito a sua maneira. Para uma banda que havia acabado de sair de sua maior, mais cara e mais colorida turnê, um disco como Ghost Stories até parecia uma freada brusca. Mas só parecia, pois o estilo melancólico das composições vinha vestida de uma forma bastante bonitinha, que nada lembrava os dois discos precursores. Se o anterior não parecia muito criativamente também, a banda se defendia sob o argumento de que era um trabalho mais curto e mais econômico. Até mesmo a turnê de Ghost Stories foi mais curta, passando por pouquíssimas cidades e voltando a ter shows intimistas. Mas A Head Full Of Dreams não tem para onde correr: é um disco feito para vender muitas cópias e ingressos caros de shows enormes em estádios de futebol ao redor do globo (Brasil, Argentina, Chile, Colômbia e Peru incluídos).
É totalmente compreensível que uma banda como Coldplay tenha se tornado um fenômeno mundial e que a pressão por parte do empresário e da gravadora seja grande para que façam o próximo disco de sucesso (comercial) e que renda o suficiente para que todas as pessoas e famílias debaixo das asas da banda consigam lucrar e garantir o trabalho por muitos meses. Uma banda como essa movimenta uma pequena parte da indústria da música e é muito difícil retroceder, em termos de alcance e escala, e manter a mesma estrutura. Mas nada disso justifica a fraqueza de um trabalho como A Head Full Of Dreams, o disco menos prestigioso da banda justamente em um ano em que vários outros grupos e artistas fazem voltas gloriosas e se superam. Seguiram o fluxo do que já está dando certo para muitos artistas e esqueceram do que é que faz – ou fez – do Coldplay uma banda relevante. Se tiverem sorte, o público ainda lembrará deste álbum, e não apenas de alguns singles sem nenhuma originalidade.
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